Caro amigo,
Estou sentado no trabalho vendo o tempo passar, sentindo
dores nas mãos, cotovelos e costas graças à cadeira desconfortável. As pessoas
da empresa conversam de forma exaltada na sala ao lado, conjeturando sobre a
infância no passado, a política atual e cenários pessimistas para o futuro.
Presenciei a discussão em seu início, mas logo saí de fininho por não ter muito
o que dizer sobre as temáticas.
Minha incapacidade de conversar sobre qualquer assunto sempre
foi uma das características que mais odiei em mim mesmo. Passei tantos anos
querendo discursar frente aos outros e participar de conversas animadas que,
agora, só consigo pensar em tamanho sofrimento gerado por tal perda de tempo.
Perceber que não sou obrigado a falar e que tenho o direito
de ficar em silêncio foi, em um primeiro instante, um alívio. A sensação durou
o tempo de perceber que não basta poder, pois ninguém é tão livre quanto
aparenta. O silêncio é bem-vindo desde que opiniões sejam fornecidas quando
necessário, pois ninguém pode viver sem opinar constantemente sobre tudo. A
falta de palavras é tolerável, desde que a oratória seja afiada e sempre pronta
para funcionar. O mundo parece girar entre aqueles que gostam de falar, ainda
que a maior parte do que é dito não faça sentido.
Se você está calado, você é considerado culpado, conivente, dissimulado,
alguém que esconde algo. A quietude não pode significar apenas uma inaptidão da
fala e, principalmente, uma desculpa para deixar vozes mais eloquentes em foco?
Ninguém precisa conversar o tempo todo. O mundo parece esquecer-se que nem tudo
é expresso em uma opinião, e o silêncio nem sempre é triste.
Penso em décadas passadas em que artistas, escritores e excêntricos
viviam sozinhos e eram considerados párias de sua época. Podiam nada dizer, mas
pintavam emoções e críticas, escreviam sobre o que se interessavam ou simplesmente
ficavam em silêncio, pois não tinham vontade de falar. Nem por isso deixavam de
ser pessoas extraordinárias.
Não gosto de falar e nem gostarei. Sou calado, quieto e não me
sinto à vontade em conversar efusivamente em meio aos outros. Por que deveria
fazer isso? Recuso a fazer tal coisas, ainda que meus dias sejam, muitas vezes,
sofridos. Consigo imaginar seu sorriso irônico ao pensar que me formei em um
curso na maldita área da comunicação, mas tenho outras habilidades aquém de
opinar sobre política, economia, etc etc. Esse é um assunto para outras cartas.
Espero que tenha sentido minha falta no último ano, com
meses marcados apenas por cartas pontuais de dias nebulosos e tristes. A
tristeza é uma companheira que vive no bolso esquerdo da calça, mas os últimos
dias estão amenos e até bem felizes. Não entrarei em detalhes para não azarar
este ano que se inicia. A boca segue fechada, mas os dedos vão ferozes expondo
tudo aquilo que deseja e se interessa.
Tristes ou felizes, não importa. As ideias seguem
determinadas.
Com carinho
M.
Postar um comentário