Era uma vez um reino que se erguia quando não existia mais esperança. Um local para acalentar os corações mais pesarosos, as almas solitárias e as vontades desesperadas. Não um reino de ficção, fantasia ou imaginação, mas um domínio certo para os abandonados, quando desistir do mundo era a opção mais fácil.
Pintura "Castle (Castle Fairy Tale)", de Mikalojus Ciurlionis, 1909
Era um reino pequeno, talvez o menor de todos, com uma população tão seleta quanto um clube para ricos. Para ser sócio, bastava apenas desistir e seguir por suas ruas de cabeça baixa. Era um local de passagem, que perdurava até que a esperança surgisse, ou o arrependimento, ou até mesmo outras vontades. Um reino nem um pouco egoísta, mas desejoso de levar o bem aos seus habitantes por onde quer que eles se encontrassem.

O reino sempre existia na montanha mais próxima, aquela a tocar o céu. Bastava apenas desistir e, no minuto seguinte, lá estava ele em todo o seu esplendor a frente do desistente. Uma floresta sempre verde circundava o reino por todos os lados, com árvores milenares e flores raras a desabrochar. A natureza era fortemente preservada no local, pois ela levava os habitantes à reflexão, ao raciocínio e à meditação. O reino era um local para pensar.

Para alcançar o topo da montanha, o primeiro passo a fazer seria percorrer uma longa estrada de mármore a perder de vista. Extensa por dar voltas e voltas pela montanha, e tão comprida que deixaria até mesmo um maratonista cansado. Mas isso não importava. No reino, o tempo não era uma preocupação, pois as pessoas poderiam andar para sempre que não saberiam a diferença. O tempo nada significava. Se a pessoa andasse com sorte, mas muita sorte, uma carruagem brilhante com cavalos negros lá estaria correndo pela estrada para levá-la até o topo. Mas a sorte de encontrar o reino já era o suficiente para toda uma vida.

O reino era formado por três círculos distintos entre si, que comportavam toda a população do local. No primeiro se encontrava as moradias, todas feitas de pedra. Um mesmo material de construção, para diferentes modelos e formas, com cada casa sendo feita pelo próprio dono da maneira que quisesse. A grama do vizinho nunca era mais verde, pois todas as gramas eram bem cuidadas e verdes o suficiente. 

O segundo círculo era o local de trabalho. Não o trabalho para viver, mas ofícios que levariam bem ao reino e ao indivíduo. Já o terceiro círculo era aquele para as pessoas se dirigirem e pensar sobre a vida. Para aqueles que gostavam de ficar sozinhos, bancos em praças e ruelas suportavam a todos. Para aqueles que gostavam de se manter ocultos ou escondidos, havia uma quantidade suficiente de becos, arcos, passagens secretas e jardins para o anonimato.

No topo da montanha lá estava o castelo, em que o rei solitário vivia entre quadros infinitos e corredores obscuros. O rei não era uma pessoa de linhagem sagrada ou sangue azul, pois o sangue vermelho e a simplicidade eram suficientes para levar ao poder. Todas as pessoas são sagradas e importantes a sua maneira. Qualquer um poderia ser rei, de ricos a pobres, sendo escolhido por votação popular. Poderia ser rei até o dia que desistisse, o que não demorava muito.

O Reino da Deserção lá estava para quem necessitasse de seu aconchego. O céu azul a encher o coração de sentimentos estranhos, o sol a tocar a nuca dos cabisbaixos. Um reino para quando mais se precisa de socorro, após o mundo não apresentar solução. Uma província não de esperança, mas um local de contemplação.