Aquela noite, esvaída há muito pelo tempo, foi uma das noites mais bonitas de que se teve notícias. O céu era um grande espetáculo de luzes, com as estrelas brilhando e cintilando no alto. Era como se a Terra houvesse saído de sua rota e se aproximado bilhões de vezes dos outros astros, e a Lua, em sua forma cheia mais admirável, aparentava curiosidade pelas interações terrestres e, bem perto, observava a tudo e a todos, banhando cada canto com sua luz como se fosse dia.

Em meio a uma floresta conhecida por todos como encantada, uma garota chorava debaixo de uma árvore. A noite e o local convidavam à felicidade, mas tal garota fazia um pedido desesperado às estrelas, à Lua e à todos os astros possíveis de se ver em um céu tão límpido. Ela estava cansada. Tão cansada de tudo que abraçava com força suas pernas e não conseguia se mexer. Ela estava cansada de sua vida tão pobre, de estar sempre trabalhando com os pais, de não ter amigos.

A grama acariciava sua pele exposta, e sua camisola branca reluzia em meio à natureza de cores escuras. Grandes lágrimas escorriam por seus olhos, como pedras preciosas que brilhavam ao cair. E assim, ficou por vários minutos, chorando baixinho.

Como o outono alcançara o local alguns dias antes, um suave vento soprava as pedras com musgos e as árvores frondosas da floresta, levando folhas marrons e alaranjadas ao chão. Mas a garota não sentia o frio, perdida em seus próprios pensamentos. Não foi capaz, também, de perceber pequenas luzes que sobejavam pelo ar à sua volta, nem alguns seres de chapéus pontudos escondidos atrás de enormes pedras,  ou mesmo um vulto encapuzado que saiu por trás de uma árvore e veio se aproximando lentamente em sua direção.
- Uma moeda por seus pensamentos - disse o vulto, com voz baixa e suave.

A garota, esquecendo suas angústias devido à imposição de tal voz desconhecida sobre o silêncio, abriu os olhos e foi arrebatada pelo alvoroço que ocorria à sua volta. Ouvira falar dos seres que se escondiam pela floresta, além de ter sido alertada acerca deles, mas nunca imaginara que um dia iria encontra-los. Não sabia o que dizer, o que pensar. Soube apenas sentir medo, um medo que a corroeu por dentro e gelou sua espinha.

O vulto deu um passo para perto da garota, e ela se levantou sobressaltada, imaginando que criatura vil poderia estar por baixo do capuz. O vulto deu outro passo e a menina ficou paralisada, com o medo permeando cada parte de seu corpo, sem conseguir se mexer. Ele foi se aproximando, mais e mais, até chegar bem perto, com a distância de um braço, e levantou diligentemente o capuz.

Era um garoto. Um garoto de sua idade, de orelhas pontudas.
- E então? - perguntou ele, com um sorriso nos lábios.
A garota sentiu o medo ir embora. Era um jovem elfo, que nunca poderia lhe fazer mal.
- E... e.. então o quê? - disse, com uma voz fina, sumida.
O garoto deu uma gargalhada, percebendo a confusão, a dúvida e o receio por parte da menina.

- Eu havia dito: uma moeda por seus pensamentos - e levantou a mão direita, onde era possível ver uma grande moeda dourada, luzidia, que recebia o luar e parecia brilhar em sua mão. Ele então pegou a linda moeda e a colocou na mão da garota.

Ela não conseguia entender como seus pensamentos poderiam ser importantes perto de elfos, gnomos e fadas. Não entendia como eles estavam ali, o porquê de aquela situação mágica estar ocorrendo justamente com ela. Mas como por encanto, ao ter a moeda em suas mãos, seus lábios se abriram e ela se viu contando sua história, suas mazelas, o que lhe afligia. E todos aqueles seres ouviram, compadecidos, sua fábula pessoal.

Quando terminou seu relato, o silêncio se abateu sobre a noite clara. As fadas pequeninas sobrevoavam galhos ao redor, tão perto que quase tocavam seu rosto. Os duendes haviam saído de trás das pedras e se sentaram perto da garota, com seus chapéus pontudos a dançar ao sabor do vento. E o elfo a observava com olhos cintilantes, esperando, e ela percebeu que precisava dizer mais.

- Eu não tenho nada a oferecer - disse a garota. - Sou pobre, desafortunada, de família humilde, como acabei de lhes narrar. Mas gostaria muitíssimo de ouvir as palavras de nobres seres como vós.
- Jovem donzela, suas palavras e sua doce voz já bastam para nós. Agora chegou a nossa vez de falar - disse o garoto elfo.

Naquele momento, os nobres seres da floresta tomaram a voz, e a garota, sendo presenteada entre todas as pessoas que habitavam as redondezas com tamanha dádiva, pode ouvi-los. Eles narraram seus desejos, suas lembranças, seus mais puros pensamentos. Contaram sobre guerras, sobre a paz, sobre a vida encantada na floresta. Eram vozes finas, grossas, agudas e graves, que se alternavam como música, encantando a garota e a deixando de boca aberta e os olhos arregalados e sem nem piscar.

Mas assim como tudo o que se inicia em algum momento, as histórias dos seres da floresta tiveram um fim. E a garota sentiu um tristeza profunda por ter que abandona-los, talvez para sempre. Mas se despedindo, o elfo deu um beijo na bochecha da garota e disse olhando bem no fundo de seus olhos:
- Quando se sentir sozinha ou triste, venha novamente para este local que estaremos lhe esperando. E lembre-se: estaremos sempre aqui por você.

Assim, a garota nunca mais se sentiu sozinha. Sempre que a tristeza parecia grande demais, que sentia a solidão apertar e a vida não parecer sorrir, ela ia para o lugar na floresta em que encontrara os seres pela primeira vez, e era saudada pela frase "uma moeda por seus pensamentos", ganhando uma moeda dourada e brilhante em seguida.

Mas o que passou ali, ela nunca contou a ninguém, e nem as moedas para pessoa alguma mostrou. Nas primeiras idas à floresta, as moedas que ganhava eram guardadas em seus bolsos, e levadas para onde quer que fosse. Mas com o tempo, passaram a ser numerosas demais. A garota então começou a colocá-las em latas, e enterra-las exatamente no local em que as ganhava, debaixo de uma grande árvore.

Os anos se passaram, e a garota cresceu, sem nunca deixar de entrar na floresta e visitar seus encantados amigos. Ela casou, teve filhos, novos amigos vieram, mas o segredo sempre esteve guardado. Quando a idade foi pesando nas costas, em um determinado dia, já bem velhinha, a garota que não era mais garota entrou na floresta para nunca mais voltar. Simplesmente desapareceu, sem explicação. Mas era possível, para os moradores que lá viviam por perto, ouvir risadas, conversas e luzes a piscar pelas árvores em noites de Lua cheia. E as moedas, o maior tesouro da garota, se mantiveram enterradas na floresta, em pequenas latas, prontas para serem descobertas e, acima de tudo, prontas para libertar pensamentos e histórias de encanto que apenas aquela floresta encerrava dentro de si.