Histórias de horror e mistério, tão populares antigamente, perderam um pouco o espaço com o desenrolar dos anos. Talvez pela falta de interesse do público, o estilo esteve fechado por muito tempo a círculos específicos e um tanto restritos, mesmo que autores como Stephen King, Clive Barker e Anne Rice sempre marcassem presença nas livrarias pelo mundo. Nos últimos anos, principalmente com a ascensão de histórias sobrenaturais, o gênero foi novamente colocado em foco, atraindo o público e levando a novas, assim como antigas, histórias de terror.

Autores como H. P. Lovecraft e Edgar Allan Poe, tão importantes para a consolidação do gênero na literatura mundial, caíram no gosto popular e ganharam mais fama do que nunca. Com esse resgate do tradicional terror, novos autores começaram a criar histórias originais do tema, assim como escritores famosos por outros estilos, que passaram a inovar e também entraram neste mundo. É o caso de John Boyne em seu último lançamento no Brasil, A Casa Assombrada.

Desde o início de sua carreira, Boyne vem presenteando os leitores com uma série de romances e dramas históricos, ambientados em épocas como a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Iria me demorar muito se fosse citar todos os livros que gostei do autor (na verdade, gostei de todos eles), mas preciso destacar O Menino do Pijama Listrado. Lançada em 2006, a obra tornou o autor irlandês famoso quando deu origem a uma adaptação para o cinema dois anos depois, que levou milhares de pessoas às lágrimas com sua história narrada por um garoto de 8 anos ao lado de um amigo judeu, que vivia em um campo de concentração.

A maioria das histórias de Boyne partem do ponto de vista de jovens e crianças, e como não poderia deixar de ser, além dos romances históricos o autor escreveu livros juvenis, com o estilo predominante sendo a fantasia. É o caso de alguns lançamentos dos últimos anos, como Noah Foge de Casa e A Coisa Terrível que Aconteceu a Barnaby Brocket.

Em A Casa Assombrada, pela primeira vez em sua carreira Boyne cria uma história de terror, suspense e fantasmas. O livro tem como personagem principal Elisa Caine, uma jovem de 21 anos que se vê sem ter para onde ir quando seu pai morre. Em luto, sem dinheiro para permanecer na própria casa e querendo mudar de cenário e sair de Londres, ela resolve aceitar um anúncio para ser governanta e cuidar de crianças no interior do país. Ao chegar ao condado de Norfolk, a jovem encontra Gaudlin Hall, uma mansão em que mora apenas duas crianças, sem nenhum adulto por perto e uma força estranha que parece rondar pelo local. Sozinha, ela começa a querer desvendar o mistério por trás da sinistra história da família, que todos os habitantes do condado parecem ter medo de mencionar.

Charles Dickes não apenas aparece na história como é citado durante todo o livro, e é mais do que perceptível o quanto John Boyne quis fazer uma homenagem ao autor imortal, além de criar uma história aos moldes das antigas histórias de terror. Posso dizer que Boyne cria uma história satisfatória, envolvente e cativante, e que realmente faz jus aos mistérios do passado, mas não chega a ser nenhuma obra-prima.

A Casa Assombrada segue todos os moldes prontos de um livro de mistério e terror. Técnicas como abordar um assunto e apenas voltar a ele vários capítulos depois, criar cenas de suspense que logo são descartadas, além de terminar um capítulo no meio de uma cena extremamente tensa, são pontos que já vi muito em histórias antigas, e o autor realmente foi bem sucedido em seu feito. Mas modernizar nem sempre é ruim, e algumas das técnicas são clichês e foram semelhantes as que vi em livros como as da série Goosebumps, e é o que me leva a ter a sensação de que o livro deveria estar mais figurado entre as obras juvenis do que as adultas de Boyne, mesmo que o tema seja mais pesado.

O que me incomodou um pouco durante a maior parte do livro é a história em si, que não achei nem de longe tão original como parecia. Uma jovem governanta em uma mansão, cuidando de uma garota e seu irmão mais novo, sem os pais ou a família por perto, onde coisas estranhas acontecem? Se mudarmos a narrativa para o ponto de vista da garota, e ela se chamar Florence, temos a história de A Outra Volta do Parafuso, de Henry James, que tanto contribuiu para as histórias de terror contemporâneas. Aliás, o livro foi levado ao cinema duas vezes e gerou uma adaptação literária moderna com A Menina Que não Sabia Ler, de John Harding. Tudo bem que as histórias são diferentes, com um desenrolar totalmente distinto, mas a falta de originalidade me incomodou um pouco. Fonte de inspiração ou não, as semelhanças são claras com a obra de Henry James.

O que considero como o diferencial do livro, e que realmente me chamou a atenção, é o fato da história ser contada pelo ponto de vista de Elisa Caine, uma personagem fantástica e muito bem escrita. Se todos os personagens principais de John Boyne são sempre escritos de maneira delicada e cuidadosa, no caso de Elisa, a primeira personagem principal feminina do autor que leio, a história não poderia ser diferente. Ela se mostra uma pessoa de um caráter e uma fibra moral excepcionais. Em pleno século XIX, quando era esperado das mulheres apenas a submissão perante os homens, Elisa Caine se mostre forte, destemida e levantando a voz para ter suas vontades atendidas.

Não digo nem de longe que o autor decepcionou com A Casa Assombrada, mas também está longe de levar uma obra formidável para os leitores, sempre ávidos por seus lançamentos. Falta um brilho, um diferencial, aquele ponto marcante que faz com que apenas uma página já seja o suficiente para saber que o livro é de John Boyne. Se fosse escrito por qualquer outro autor, eu teria aprovado de forma extremamente positiva, mas do Boyne eu sempre espero algo a mais, o que não encontrei no livro. É bem escrito, tem uma boa história, envolve e faz juz ao gênero. Mas ainda assim, está apenas conforme os padrões e parece que falta alguma coisa.