No início havia apenas o homem, corpulento e de cabelos negros. Seus traços foram delineados no espaço vazio com extrema cautela, formando o queixo quadrado, as pernas longas e os olhos inteligentes. Ele também foi abençoado com uma voz de barítono, para ser respeitado, admirado e capaz de levar suas ideias para onde quer que fosse, mesmo que ali estivesse sozinho e sem ninguém para ouvir. 

Em seguida surgiu a sala de aula, pequena e abafada. O piso foi pincelado com uma cor cinzenta, repleto por manchas brancas e longos riscos, sem ninguém para limpar. As paredes tingiram-se de bege e o quadro negro foi logo colorido de azul, mesmo tom das grandes janelas laterais. Os pobres ventiladores de teto giravam devagar, tão velhos que pareciam aptos a despencar a qualquer instante.

Devagar vieram os móveis, corroídos pela mente, sustentados pela sujeira que acabara de se formar. Eram tediosos e escassos: a mesa do homem na frente, de ferro batido; as vinte mesas e cadeiras de madeira branca, preenchendo quase todo o ambiente; o armário de metal pintado de azul, no fundo. Apenas isso.

Logo depois apareceram as crianças. Eram muitas, estridentes, barulhentas, confusas. Foram dotadas pelo sopro da ingenuidade e da rebeldia, o que se refletia nas mochilas coloridas, nas besteiras que diziam umas para as outras e nas risadas intermináveis sobre qualquer assunto. Algumas não possuíam dentes, outras eram loiras, muitas tinham ranho escorrendo do nariz.

Rápido como a morte, veio o calor. Entranhou-se na sala como um parasita munido das piores intenções, sugando a vitalidade de todos que estavam por ali. Podia ser encontrado na sola do sapato do homem, no bolso da menina sardenta, debaixo da penúltima mesa da quarta fileira. O calor fazia brotar o suor e a inquietude em todos os seres da sala.

Lentamente apareceu o pânico dentro do homem. A síndrome foi borrifada dentro de sua mente por forças invisíveis, e ele não sabia exatamente o que estava sentindo. Começou a se desesperar pelas crianças que não prestavam a mínima atenção em seus monólogos, além da estupidez juvenil que se estendia até o fim do mundo. Queria correr para nunca mais voltar.

Por fim, no horizonte do vazio, surgiu a escola. Era grande como o infinito, pois todos os que entravam por suas portas conseguiam sair apenas décadas mais tarde. Sim, ela englobava todo o resto das coisas e pessoas, mas ainda era formada por memórias. Aquelas lembranças delicadas que ajudavam a fixar pôsteres nas paredes, e também os pesadelos tempestuosos que entupiam a pia do sanitário masculino.

Às 15h37, o homem tropeçou e caiu no chão, fazendo tremer toda a sala. Os móveis começaram a se desbotar e as crianças gritaram esbaforidas. O calor se tornou gota de orvalho, que entrou na mente do homem e selou o pânico que germinava. E assim, a escola se desintegrou, sem aviso ou esperança.

Agora é apenas uma página em branco, sem traço ou sem risco. Não há mais o que ver ou ouvir, nem vozes ou matéria para preencher o espaço. É o nada. Tudo o que surgiu e desapareceu, tudo o que será manifestado e assassinado, está na mente daquele que cria para redimir seu mundo. Ele faz surgir homens e salas, crianças e sentimentos, na esperança de encontrar a si mesmo. Ele espera. Ele ouve. Ele estica sua mão invisível e tenta traçar tudo o que pode.