Lançado há quase 30 anos, o filme O Império do Sol, de Steven Spielberg, marcou o âmbito dramático da Segunda Guerra Mundial, sobretudo pela fantástica atuação do jovem Christian Bale. Considerando que esbarrei com o filme há vários anos atrás, pouco me lembro de seu enredo atualmente. Ainda assim, algumas cenas marcaram de forma intensa minha infância, fazendo com que guardasse alguns flashes em minha mente, os quais me envolveram e chocaram durante muito tempo. Dentre eles, posso compartilhar especialmente a cena de um jovem garoto se perdendo dos pais em meio a uma multidão que fugia desesperada, e esse mesmo garoto, anos depois, tentando exorcizar a imagem do rosto dos pais em sua mente, memória que ia perdendo pouco a pouco. 

Tais flashes, desconexos e sem sentido em meus pensamentos, viram a oportunidade de ordenação quando me deparei com o livro que deu origem ao filme, obra de J. G. Ballard. O que percebi durante a leitura, porém, foi algo completamente diferente. Minhas lembranças foram destruídas durante todo o desenrolar do livro, gerando apenas uma grande decepção e uma certeza clara: O Império do Sol mais promete do que cumpre.

A obra nos apresenta Jim, um garoto inglês de 11 anos que vive em meio ao luxo e a opulência junto a seus pais. O cenário é Xangai, e o ano, 1941, com a Segunda Guerra já declarada e uma China rodeada por conflitos e pelo medo constante. Porém, nada prepara Jim e sua família para o grande ataque japonês que viria a seguir, o que levou ao trancafiamento de chineses e estrangeiros em campos de concentração. Perdido sozinho em meio ao mundo em guerra, o jovem Jim inicia sua própria luta pela sobrevivência, marcada pela eterna busca pelos pais no território devastado. 

A história de J. G. Ballard, como anunciada na contracapa do livro, é em grande parte autobiográfica. O autor e sua família de fato vivenciaram os escuros anos da Segunda Guerra Mundial na China, sendo prisioneiros dos cruéis campos de concentração do exército japonês. Mas o que talvez conservasse o objetivo de se apresentar como um relato do tempo de Guerra e memórias do sofrimento, nada mais são do que palavras em grande parte sem emoção rodeadas pela monotonia. Um relato frio da crueldade, extremamente descritivo e que não me chamou a atenção em momento algum.

A escrita de Ballard não se concentra em nenhum ponto aparente. Não é uma escrita simples e inocente, o que seria se acompanhasse a visão de Jim, mas também não é algo profundo e complexo, como seria um livro abordando o intrincado cenário mortal da Guerra. São palavras soltas pelas páginas que pouco me despertaram o interesse, e quase nunca fizeram com que me sentisse envolvido pela história.

Jim, em suas andanças pelas cidade chinesas, depara-se constantemente com as maiores atrocidades possíveis, entre a guerra, a fome e o desespero. Porém, nenhuma de tais atrocidades parece levantar grandes questionamentos emocionais no garoto. Ao lado de descrições frias sobre a morte e o sofrimento, acompanhadas por relatos sem grande pertubação de corpos espalhados por campos abertos, o que é descrito com emoção no livro, e o que mais desperta o fascínio de Jim, são aviões. Aviões dos mais diversos tamanhos e modelos, descritos nas mais perfeitas condições, mas que em mentes leigas no assunto, como é a minha, nada significam.

Os personagens secundários pouco acrescentam algo à história. Basie, companheiro de prisão de Jim, talvez seja o de maior destaque, mas que em momento algum chega a ser cativante ou um personagem envolvente. Por qualquer motivo deixa o jovem de lado, e suas aparições na obra não desenvolvem tramas interessantes. A Sra. Vincent, mulher que tanto fascina Jim no campo de concentração de Lunghua, quase nenhuma fala possui durante toda a obra. Talvez o Dr. Ransome, médico do campo de prisioneiros, seja um dos personagens que mais chamam a atenção, mas que tampouco aparece em capítulos frequentes. Em sua maior parte, são esses os personagens de maior importância na obra, mas que pouco significam no desenrolar das páginas.

Surpreendido pela pouca, ou nenhuma fama, de O Império do Sol, mesmo com o filme tão aclamado por crítica e público até os dias de hoje, ao término da leitura percebi que a incógnita literária nada mais é do que justificada. Um livro desinteressante, com falta de ação e excesso de descrições, em meio a uma Guerra em que aviões despertam mais a atenção do que mortos, a história pouco atrai o leitor. Jim é um garoto apático e nada mais, o que leva aos leitores tal indiferença, fazendo com os olhos percorram as palavras mas nada se sinta. O Império do Sol está entre as poucas obras literárias em que as adaptações cinematográficas conseguem atingir a verdadeira qualidade da história, mas apenas nas telas. Mais vale ver a estreia de Christian Bale na película de Spielberg, do que a escrita pouco inspirada de J. G. Ballard.